Os "doidinhos" daqui, que se vêem nas ruas, não parecem moradores de rua, nem de fato parecem serem marginalizados ou estarem numa situação de carência financeira.
Parecem pessoas do bairro, todos os comerciantes os conhecem.
Fico criando hipóteses sobre como e quando surtaram.
Parece haver alguma pressão invisível pairando sobre todos nós por aqui. Esses "doidinhos", penso, serem aqueles que desistiram do gesto performativo social que vela tal pressão. Eles se tornam a manifestação dessa pressão que nos incomoda, são nossos eleitos para serem "doidinhos", são a atestação dessa atmosfera pesada que também nos convoca à explodir, a cessar qualquer contenção.
Um comentário:
Em Praga havia também doidinhos que ficavam pelas estações de metrô, bebendo vinho barato, passando frio.
Às vezes eram interpelados por policiais, mas de resto as pessoas passavam pelas praças com seus cachorros sem se incomodar, aquilo parecia instituído, parte da paisagem, pessoas convertidas em paisagem.
Uma delas era visivelmente louca, falava sozinha, às vezes reclamava bem alto, parecia xingar os céus. Eu ficava com uma dor no coração mas não sabia o que fazer. Um dia vi que ela estava tremendo de frio, e lhe dei meu casaco. Ela agradeceu e sorriu. Mesmo assim senti que meu pequeno ato de desprendimento não significara nada para mim, e que era largamente insuficiente. No dia seguinte e nos outros, nunca mais vi a doidinha. Não sei o que aconteceu.
Mas Praga não existe mais. Nunca existiu.
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